Pierre BOURDIEU

 

Os estudos e pesquisas em sociologia da educação, que efetivamente fornecem análises relevantes e inovadoras em relação às instituições e teses presentes em Les Héritiers, são numerosos e representam um progresso inegável. As novas questões de pesquisa melhoram a compreensão e explicação de todos os modos de funcionamento da escola e, para alguns deles, enriquecem a compreensão dos processos de desigualdades de oportunidades diante da escola.

Mas no contexto das extensões de Les Héritiers, podemos concluir que as relações com a cultura (e o conhecimento) continuam sendo determinantes significativos das desigualdades antes e na escola. O processo de eliminação do acesso ao ensino superior está certamente em declínio, mas não desapareceu: um em cada dois jovens tem agora acesso a este ensino (Insee, TEF, 2008) e as crianças das categorias sociais mais desfavorecidas ainda estão sob -representado no ensino superior. Os processos de restrição de escolha e atraso ainda estão muito presentes para as crianças dessas categorias e, a esses dois processos, soma-se agora o de rebaixamento. É no acesso aos setores muito seletivos e essenciais na reprodução das elites que as desigualdades continuam sendo as mais acentuadas e apenas 13% dos alunos de origem social desfavorecida (empregados e trabalhadores) integram grandes escolas (relatório do Senado, setembro de 2007). ). Além disso, as redes sociais (baseadas na filiação de classe sociocultural) são cada vez mais decisivas na promoção do diploma e na manutenção de uma forte desigualdade de sucesso profissional e estatutário com igual sucesso acadêmico. Na condição de estudante, a pesquisa certamente enriqueceu o conhecimento sobre o assunto, mas as análises dos Héritiers mantêm certa relevância.

Este ensaio, que foi um dos pontos de partida mais importantes para a pesquisa em sociologia de Bourdieu e Passeron, contribuiu largamente para a constituição da análise sociológica da escola e da educação na França e, em certa medida, no exterior. A contribuição de seu trabalho é considerada fundamental. O seu tema de investigação, juntamente com outros três, constitui a análise de dados estatísticos, a investigação microssociológica, a investigação sócio-histórica, o corpo de conhecimento essencial da sociologia da educação.

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« Pressupondo que a vida é uma historia, e que os acontecimentos da existencia individual concebidos como um conjunto inseparavel de historia e relato dessa historia, vemos que a historia de vida é um caminho, com estradas, encruzilhadas e emboscadas, ou um caminho que percorremos e que deve ser percorrido, um deslocamento linear, unidirecional, que tem um comeco, etapas e um fim, um fim da historia.

Isto é aceitar a filosofia da historia no sentido de sucessão de acontecimentos, implicita numa filosofia no sentido de relato historico, numa teoria do relato, relato de historiador, notadamente biografico ou autobiografico. Pode se tentar extrair pressupostos desse teoria :o fato de que a vida constitui um conjunto coerente e orientado, uma « intenção » subjetiva e objetiva.

Essa vida organizada transcorre segundo uma ordem cronológica, ordem logica, no duplo sentido de ponto de partida.

O relato, seja ele biografico ou autobiografico como o do investigado que se "entrega" a um investigador, propoê acontecimentos que, sem terem se desenrolado sempre em sua escrita sucessão cronológica: tendem ou pretendem organizar se em sequencies ordenadas segundo relações inteligiveis. O sujeito e o objeto da biografia tem de certa forma o mesmo interesse.

O relato autobiografico se baseia sempre na preocupaçāo de dar sentido, de extrair uma logica ao mesmo tempo retrospectivas e prospectiva, construidas em etapas de um desenvolvimento necessario. A propensāo a tornar-se o ideólogo da propia vida conta com a complicidade natural do biografo, por suas disposições do profissional. Produzir uma historia de vida. Tartar a vida como uma historia, como um relato coerente, talvez seja conformar-se com uma ilusão retorica.

O mundo social, que tende a identificar a normalidade com a identidade entendida como constancia em si mesmo de um ser responsavel, a maneira de ma historia bem construida, dispõe de todo tipo de instituições e universo possivel.

Assim o nome propio pode ser considerado também como um ponto fixo no mundo que se move, tem razão em ver nos batizados a maneira necessaria de determiner uma identidade ».

BOURDIEU, Pierre, « A ilusão biográfica » in FERREIRA, M e AMADO, J (orgs) Usos e abusos da história oral, Rio de Janeiro : Fundação FVG, 2006,
p 183-192

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